Evangelho (Lc 11,14-23): Jesus estava expulsando um demônio que era mudo. Quando o demônio saiu, o mudo começou a falar, e as multidões ficaram admiradas. Alguns, porém, disseram: «É pelo poder de Beelzebu, o chefe dos demônios, que ele expulsa os demônios» . Outros, para tentar Jesus, pediam-lhe um sinal do céu. Mas, conhecendo seus pensamentos, ele disse-lhes: «Todo reino dividido internamente será destruído; cairá uma casa sobre a outra. Ora, se até Satanás está dividido internamente, como poderá manter-se o seu reino? Pois dizeis que é pelo poder de Beelzebu que eu expulso os demônios. Se é pelo poder de Beelzebu que eu expulso os demônios, pelo poder de quem então vossos discípulos os expulsam? Por isso, eles mesmos serão vossos juízes. Mas, se é pelo dedo de Deus que eu expulso os demônios, é porque o Reino de Deus já chegou até vós. Quando um homem forte e bem armado guarda o próprio terreno, seus bens estão seguros. Mas, quando chega um mais forte do que ele e o vence, arranca-lhe a armadura em que confiava e distribui os despojos. Quem não está comigo é contra mim; e quem não recolhe comigo, espalha».
O texto fala de Jesus expunsando um demônio que deixava um homem mudo, que começou a falar. Este “milagre” faz com que alguns do entorno critiquem Jesus. Melhor seria, então, que o homem permanecesse mudo?
Isto é atual no nosso mundo de hoje – deixe os pobres, os excluídos, os analfabetos, os desempregados, os sem poder de pressão, MUDOS! Dê à eles algumas migalhas para não sucumbirem e chamarem atenção, mas deixe-os mudos. Não os faça falar.
Na história da humanidade, alguns profetas foram as vozes destes mudos: Dom Helder Câmara, Dom Luciano, Madre Teresa de Calcutá, e hoje ainda temos algumas vozes destes mudos: Dom Pedro Casaldáliga, Padre Viana, Dom Paulo Evaristo Arns... e outros tantos, inclusive anônimos.
Deixe-os mudos! É a ordem do dia... deixar tudo como está... não altere a realidade... Existe inclusive hoje uma religiosidade forte crescendo neste sentido: louve a Deus, e agradeça por tudo tal como está – orações vazias que em nada se comprometem com o outro, que não quer dar voz aos que foram emudecidos pelo sistema capitalista, pelo sistema néo-liberal, pelo sistema pecaminoso que predomina na sociedade e fabrica os ricos e os pobres, os que falam e os mudos, os que tem voz e os que foram calados... Jesus não aceita esta realidade e devolve a voz ao que foi emudecido.
A pergunta talvez hoje seja: eu estou dando voz aos emudecidos, ou seja, estou fazendo minha parte para mudar a realidade, ou estou deixando tudo como está, buscando uma religiosidade do conformismo, da inanição social? Ou pior: por acaso tenho emudecido alguns?
Jesus não se conforma com a realidade. Ele faz o bem e é criticado, pois na verdade ele até poderia fazer o bem, desde que nada e alterasse no sistema. É a religião do “status quo”, religião que nada altera a realidade do pobre e do oprimido – religião podre!
Eu me lembro quando Jesus expulsou o demônio (libertou) aquele homem de Genesaré, matando dois mil porcos – mudando a economia do local. Jesus foi expulso daquele lugar, pois ele poderia fazer o bem àquele homem, desde que não mexesse na economia daquela comunidade. Jesus ensina que não tem como fazer justiça social, sem mudar o sistema que produz o enriquecimento ilícito de alguns e o empobrecimento de outros.
Que o Pai me guie para que eu seja instrumento de expulsão de demônios, ou seja, que eu possa ser voz dos que não tem voz, dos que foram emudecidos, e que, dentro das minhas possibilidades, possa devolver a voz dos que foram calados pela repressão social, econômica e política existente no estado de São Paulo.
Amém.
Marco Aurélio de Souza
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