No dia 1° de abril de 2010, poucos dias antes da Páscoa, a convite da diretoria, os jogadores do Santos Futebol Clube se dirigiram a uma instituição de caridade da cidade, para entregar ovos de chocolate a trinta e quatro crianças e adolescentes, a maioria deles afetados de paralisia cerebral. Na chegada, porém, boa parte do grupo não quis descer do ônibus. E qual foi o motivo? Muito simples: os jogadores eram evangélicos e a instituição, espírita...
Ed René Kivitz, que se assina "cristão, pastor evangélico e santista desde pequenino", expressou sua perplexidade ante o fato num escrito que intitulou: "No Brasil, futebol é religião". Talvez alguns de seus conceitos possam ser questionados, mas não há dúvidas: o texto tem muito a ensinar para quem adere a uma religião.
«Os meninos da Vila pisaram na bola. Mas, prefiro sair em sua defesa. Eles não erraram sozinhos. Fizeram a cabeça deles. O mundo religioso é mestre em fazer a cabeça dos outros.
Por isso, cada vez mais me convenço que o Cristianismo implica na superação da religião, e cada vez mais me dedico a pensar nas categorias da espiritualidade, em detrimento das categorias da religião.
A religião está baseada em ritos, dogmas e credos, tabus e códigos morais de cada tradição de fé. A espiritualidade está fundamentada nos conteúdos universais de todas e cada uma das tradições de fé.
Quando você começa a discutir quem vai para céu e quem vai para o inferno; ou se Deus é a favor ou contra a prática da homossexualidade; ou se você tem que subir uma escada de joelhos ou dar o dízimo na igreja para alcançar o favor de Deus, você está discutindo religião.
Quando você começa a discutir se o correto é a reencarnação ou a ressurreição, a teoria de Darwin ou a narrativa do Gênesis, e se o livro certo é a Bíblia ou o Corão, você está discutindo religião.
Quando você fica perguntando se a instituição social é espírita kardecista, evangélica ou católica, você está discutindo religião.
O problema é que toda vez que você discute religião, afasta as pessoas umas das outras, promove o sectarismo e a intolerância.
A religião coloca de um lado os adoradores de Alá, de outro os adoradores de Javé, e ainda de outro os adoradores de Jesus.
Isso sem falar nos adoradores de Shiva, de Krishna e devotos do Buda, e por aí vai.
Cada grupo de adoradores deseja a extinção dos outros: ou pela conversão à sua religião, o que faz com que os outros deixem de existir e se tornem iguais a nós; ou pelo extermínio através do assassinato "em nome de Deus"; ou melhor, em nome de um deus, com d minúsculo, isto é, um ídolo que se pretende fazer passar por Deus.
Mas, quando você concentra sua atenção e ação, sua práxis, em valores como reconciliação, perdão, misericórdia, compaixão, solidariedade, amor e caridade, você está no horizonte da espiritualidade, comum a todas as tradições religiosas!
E quando você está com o coração cheio de espiritualidade, e não de religião, você promove a justiça e a paz.
Os valores espirituais agregam pessoas, aproximam os diferentes, fazem os discordantes no mundo das crenças darem-se as mãos no mundo da busca de superação do sofrimento humano, que a todos nós humilha e iguala, independentemente de raça, gênero, e inclusive religião.
Em síntese, quando você vive no mundo da religião, você fica no ônibus. Quando você vive no mundo da espiritualidade que a sua religião ensina, ou pelo menos deveria ensinar, você desce do ônibus e dá um ovo de páscoa a uma criança que sofre a tragédia e miséria de uma paralisia mental».
Muito pertinente a reflexão do Pastor. Tais fatos, porém, não são privilégio dos jogadores do Santos. Eles acontecem também em Dourados: em algumas vilas populares e aldeias indígenas, há líderes "cristãos" que tacham de diabólicas as atividades de promoção cultural, social e econômica suscitadas por Igrejas diferentes...
Uma coisa é certa: se uma religião não desce do ônibus, seu lugar é na lixeira...
Enviar-me um e-mail quando as pessoas deixarem os seus comentários –
Comentários