Evangelho (Mt 18,15ss):
Naquele tempo, disse Jesus a seus discípulos: «Se teu irmão pecar contra ti, vai corrigi-lo, tu e ele a sós! Se ele te ouvir, terás ganhado o teu irmão. Se ele não te ouvir, toma contigo mais uma ou duas pessoas, de modo que toda questão seja decidida sob a palavra de duas ou três testemunhas. Se ele não vos der ouvido, dize-o à Igreja. Se nem mesmo à Igreja ele ouvir, seja tratado como se fosse um pagão ou um publicano. Em verdade vos digo, tudo o que ligardes na terra será ligado no céu, e tudo o que desligardes na terra será desligado no céu.
“...tudo o que ligardes na terra será ligado no céu, e tudo o que desligardes na terra será desligado no céu.”
No passado, eu ouvi uma homilia que dizia que este trecho do evangelho se referia aos sacerdotes da Igreja, fazendo menção ao sacramento da penitência, onde quando o Padre perdoava os pecados, a pessoa estaria religada nos céus; e ao pecar e não procurar a Igreja, ela permaneceria desligada nos céus. Assim, tudo o que os sacerdotes ligarem na terra, seria religado no céu e o contrário também.
O tempo passou e hoje me deparo com esta passagem novamente, e penso de outra forma.
Pode até ser que este trecho sirva para a reflexão que ouvi tempos atrás, mas hoje para mim ela ressoa diferente.
Como pode o que é ligado na terra ser ligado no céu e o que é desligado na terra ser desligado no céu?
Parece difícil, pois na nossa imaginação, temos dois lugares distintos, separados e distantes: terra e céu.
É uma concepção antiga (platônica) de um mundo dividido em duas realidades: terra e céu.
No entanto, ao não pensarmos em duas realidades distintas, separadas e distantes, teremos uma realidade só: terra e céu.
Se imaginarmos tudo como uma coisa só (terra e céu) fica mais fácil de compreendermos a mensagem de Jesus: o que liga na terra, automaticamente liga no céu – óbvio, pois se é uma coisa só!
Assim, fazer o bem, amar, servir, perdoar, praticar a justiça, são valores que não devem ser praticados quando estivermos no céu (visão platônica, dualista, de dois mundos separados), mas já, agora, neste momento. Daí, como tudo é uma coisa só (céu e terra), óbvio que as ligações que faço aqui em laços de amor (característica de Deus – do céu), passam a ser características da terra, do mundo atual.
Ou seja, concluindo a reflexão: o céu pode (e deve ser) aqui. Não é algo para “após a morte”, como se nossa vida fosse um vale de lágrimas (oração antiga) para nos fazer “merecer” o céu mediante os sofrimentos terrenos (visão antiga, dualista, platônica, fora de contexto atual).
Desta forma, fazer o céu agora é a missão de cada um, de cada cristão, de cada ser humano, de cada filho de Deus.
Nascemos para viver no céu – tem até uma música assim, mas em sentido totalmente distorcido, pois ela fala “quero morar no céu”, como se fosse algo após a morte. Equívoco! Quero morar no céu já, agora, neste momento. Pois Deus não me concebeu a vida para um tipo de qualidade de viver, para depois ter outro melhor. Deus me deu a vida para eu ser feliz, amar, servir, praticar a justiça e o amor.
E, de quem depende isto?
Não é do Governo, nem da Igreja, Sindicato, Partido, nada! Depende única e exclusivamente de mim e da graça de Deus.
Nada nos impede de hoje amarmos, sermos felizes, livres e viver a alegria de ser amado por Deus.
Como diz Paulo “quem nos separará do amor de Deus?”
Desta forma, sem visão dualística, sem visão de duas realidades distantes e antagônicas, ajamos já, praticando as realidades celestiais, para fazermos deste mundo a grande morada de Deus, que assumiu toda a realidade humana na pessoa de Jesus, exatamente para dizer: “o céu desceu aqui”.
Embora muita gente, desprezando a vida terrena, procure Deus “no céu”, dificilmente O encontrará, pois Ele desceu entre nós, ele armou tua Tenda no meio de nós, na nossa realidade, a tal ponto de dizer: “o que ligas aqui, estás ligado comigo, e vice-versa”.
Após a morte acredito que seja a concretização de tudo que sonhamos, almejamos, buscamos, construímos, desejamos, em sua plenitude. Mas esta caminhada aqui e agora só vale se for caminhada celestial.
Amemo-nos, pois “nisto reconhecerão que somos seus discípulos”, ou seja: “amemo-nos, pois nisto nos reconhecerão pessoas celestiais”.
Pessoas celestiais não são anjos fora da realidade, mas pessoas totalmente dentro da realidade, que estão prontas a amar e servir – estes são os anjos do século XXI.
E, existem muitos, posso garantir!
De resto, só me cabe ao Pai que minha vida seja celestial, que minha vida seja de um anjo, alguém que possa fazer a diferença na vida das pessoas e na sociedade – só assim, eu posso dizer que estou fazendo diferença no céu, pois esta realidade é o céu que Deus sonhou para cada um de nós! Não estraguemos o sonho de Deus!
Marco Aurélio de Souza
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