Por: Padre Wagner Augusto Portugal
O Senhor alimentou seu povo com a flor do trigo e com o mel do rochedo o saciou"(cf. Sl 80,17).
Meus queridos irmãos,
A solenidade do Santíssimo Corpo e Sangue de Cristo é o prolongamento da atmosfera pascal, atmosfera do mistério de nossa redenção pelo Senhor morto e glorificado, a Igreja quer celebrar de modo mais expresso o sacramento pelo qual participamos da doação até o fim de seu corpo e sangue, conforme a palavra de Jesus na Última Ceia.
Embora esta celebração seja uma extensão da Quinta-feira Santa, o Evangelho é o texto eucarístico de João, que não se encontra no contexto da Última Ceia, como nos evangelhos sinóticos, mas no contexto da multiplicação do pão. Jesus explica o sentido do“sinal do pão”. Para os judeus, a multiplicação do pão significou saciação material, ou seja, messianismo político. Para Jesus, a multiplicação dos pães significava o dom de Deus que desce do céu, e que é ele mesmo, em pessoa.
Estimados irmãos,
A festa de hoje poderia ser chamada à festa da presença de Jesus Cristo na comunidade dos fiéis, na comunidade cristã. Por isso mesmo se faz a procissão do Santíssimo, passando pelas principais vias das cidades, especialmente ornadas para a festa de hoje. Celebra-se, sim, a presença de Cristo na hóstia consagrada, mas se celebra sobretudo a Eucaristia como raiz e ápice da comunidade. Raiz porque, como a planta, a comunidade se alimenta e cresce através da Eucaristia, “Pão da Vida”(cf. Jo 6,35). Ápice, ponto mais alto, porque a comunidade não tem outra coisa mais preciosa nem outra escada mais segura para encontrar-se com o seu Deus e entrar em comunhão com Ele.
Há dois modos de Jesus estar presente na comunidade: uma presença chamamos de espiritual. Como Deus, Jesus está presente em toda à parte. À semelhança do vento, sopra onde, quando e como quer (cf. Jo 3,8). Como Redentor, Jesus está presente e sempre operante na comunidade, porque Ele é a cabeça viva de um corpo vivo, que é a Igreja (cf. Cl. 1,18). Somos o corpo vivo do Senhor(cf. Rm 12,5). Estamos integrados numa única construção harmoniosa(cf. Ef 2,22) em que Cristo é o fundamento e é tudo para todos(cf. Cl 3,11).
Essa presença dinâmica acontece de modo muito particular nos atos litúrgicos, tanto na pessoa do ministro quanto na palavra que é anunciada e no ato de louvor, pedido e adoração que sobre ao céu. Podemos dizer que toda oração que fazemos passa por Jesus para chegar ao seu destino, e ao chegar aos céus nossa oração já não se distingue da oração do próprio Jesus. A segunda presença de Jesus, que também escapa aos nossos sentidos, é a presença real no Pão e no Vinho consagrados. Os nossos sentidos alcançam os sinais, não a presença. A essa presença chamamos de PRESENÇA SACRAMENTAL. Embora de forma misteriosa, isto é, acima da compreensão humana, é uma presença real e verdadeira.
Assim, o Catecismo da Santa Igreja ensina que: “O modo de presença de Cristo sob as espécies eucarísticas é único. Ele eleva a Eucaristia acima de todos os sacramentos e faz com que ela seja como que o coroamento da vida espiritual e o fim ao qual tendem todos os sacramentos. No Santíssimo Sacramento da Eucaristia estão contidos verdadeiramente, realmente e substancialmente o Corpo e o Sangue junto com a alma e a divindade de Nosso Senhor Jesus Cristo e, por conseguinte, o Cristo todo. Esta presença chama-se real não por exclusão, como se as outras não fossem reais, mas por antonomásia, porque é substancial e porque por ela Cristo, Deus e homem, se torna presente completo”(cf. Catecismo da Igreja Católica n. 1.374).
As Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil ensinam que: “os pais transmitir a fé e dar testemunho do amor a Jesus Cristo e à Igreja, para seus filhos, na qualidade de primeiros catequistas. A espiritualidade conjugal e familiar se expressa na oração em família, na participação na eucaristia dominical e na dedicação aos serviços pastorais da comunidade.”(Cf. Doc 4 no. 130)
Estimados Irmãos,
A Eucaristia é o coração da comunidade cristã, seja no sentido de ser a parte central, que une a todos, seja no sentido de ser, como o faz o coração, a distribuidora do sangue da vida comunitária. Assim como podemos dizer que sem a Eucaristia a comunidade perderia sua força de ser, também podemos dizer que sem a Eucaristia a comunidade jamais chegaria a ser “um só coração e uma só alma”(cf. At 4,32), uma comunhão com Deus(cf. Jo 17,21).
A Primeira Leitura serve para preparar o reto entendimento do sinal do pão, ao qual o Evangelho faz alusão. Já no Dt 8,3,o dom do maná, do “pão caído do céu”, é interpretado num sentido não material, mas teologal: o homem vide de tudo que sai – da boca – do Senhor: sua palavra, sua Lei. Ora, a Palavra por excelência é Jesus Cristo. O Sl 147 relaciona, exatamente, o dom do trigo com a palavra que Deus manda para a terra (Salmo Responsorial).
Na Segunda Leitura, São Paulo lembra que o cálice da sagrada bênção e o pão repartido na assembléia cristã são participação e comunhão do sangue e do corpo do Senhor; participação ou “mistério” que nos faz reviver a doação de Cristo e realizá-la em nossa vida. E essa comunhão do único pão nos torna o único Corpo do Cristo.
Caros irmãos,
O Papa Francisco, de maneira catequética, nos ensina a partilhar, como centro da festa de hoje. São suas palavras sábias e prudentes: “Esta tarde, mais uma vez, o Senhor distribui-nos o pão que é o seu Corpo, fazendo-se dom. E também nós experimentamos a «solidariedade de Deus» para com o homem, uma solidariedade que nunca se esgota, uma solidariedade que não cessa de nos surpreender: Deus faz-se próximo de nós; humilha-se no sacrifício da Cruz, entrando na obscuridade da morte para nos dar a sua vida, que vence o mal, o egoísmo e a morte. Jesus entrega-se a nós também esta tarde na Eucaristia, compartilha o nosso próprio caminho, aliás, faz-se alimento, o alimento autêntico que sustém a nossa vida inclusive nos momentos em que a vereda se torna árdua, quando os obstáculos diminuem os nossos passos. E na Eucaristia, o Senhor faz-nos percorrer o seu caminho, que é de serviço, de partilha e de dom, e aquele pouco que temos, o pouco que somos, se for compartilhado, torna-se riqueza porque o poder de Deus, que é de amor, desce até à nossa pobreza para a transformar. Então perguntemos esta tarde, adorando Cristo realmente presente na Eucaristia: deixo-me transformar por Ele? Permito que o Senhor, que se doa a mim, me oriente para sair cada vez mais do meu espaço limitado, para sair e não ter medo de doar, de compartilhar, de amá-lo, de amar o próximo? Irmãos e irmãs: seguimento, comunhão e partilha. Oremos a fim de que a participação na Eucaristia nos estimule sempre: a seguir o Senhor cada dia, a ser instrumentos de comunhão, a partilhar com Ele e com o nosso próximo aquilo que nós somos. Assim, a nossa existência será verdadeiramente fecunda. Amém!
Amados Irmãos,
Corpus Christi não é veneração supersticiosa de um pedacinho de pão, nem uma ocasião para mandar procissões triunfalistas pelas ruas. É um comprometimento pessoal e comunitário com a vida de Cristo, dada por amor até a morte. É memorial da morte e ressurreição de Cristo, mas não um mausoléu; é um memorial vivo, no qual assimilamos o Senhor, mediante da refeição da comunhão cristão, saboreando um antegozo da glória futura.
O Cristo sacramentado hoje, em plena rua, à frente de nossa sociedade, recorda que atividade e contemplação constituem um binômio vital, inseparável e fecundo. Nosso trabalho não está separado da oração. A oração não é fuga da atividade. Na oração encontramos o verdadeiro sentido do trabalho. No trabalho celebramos a eucaristia da vida, da vida plena.
Que nestes dias possamos diante do sacrário adorar o Cristo presença-presente e Levá-lo para a nossa vida, santificando o mundo, fazendo de todos os batizados autênticos discípulos-missionários para que todos possam experimentar a vida plena que brota do amor de Deus que se dá a nós, sem mérito algum nosso, o Pão da Vida Eterna. Amém!
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